EXEMPLO DE MADIBA

12/04/2010



Sérgio Cavalieri

Sérgio Cavalieri é presidente da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas – ADCE/MG

“Se eu não sou capaz de mudar diante de novas circunstâncias, como posso esperar que os outros mudem”. A frase é de Madiba, forma carinhosa como Nelson Mandela é tratado pelos negros sul-africanos que o veneram. Está no filme Invictus, dirigido por Clint Eastwood e com Morgan Freeman, que, com sorte ainda pode ser visto nos cinemas. A frase foi pronunciada durante um encontro entre Mandela, recém empossado presidente da África do Sul, e um grupo de dirigentes do seu partido, vítimas então recém libertadas do cruel regime do apartheid, que deixara feridas abertas.

Será sempre uma frase importante e emblemática – no Brasil de hoje é pedagógica e essencial. Em um clima de mútua desconfiança, os seguidores de Mandela acabavam de aprovar, na reunião, a mudança do nome e das cores do uniforme do time de rúgbi, formado por brancos, com apenas um jogador negro. Era, claramente, uma retaliação. Neste exato momento chegou Mandela, de surpresa: ponderou que mudar o nome e as cores do “Springboks” equivaleria a ressuscitar assombrações ainda muito presentes nas relações entre brancos e negros, a acirrar ânimos, a estimular confrontos. Naquele momento, disse, o importante, era mirar o futuro para construir uma grande nação. Mantiveram-se as cores do Springboks, o time disputou a Copa do Mundo de Rúgbi e saiu-se muito bem, aplaudido por negros e brancos.

Nesta antevéspera das eleições presidenciais, para governadores de estado e para os parlamentos federal e estaduais, se Mandela andasse por aqui certamente repetiria sua pregação: afinal, se quisermos que os outros mudem, devemos também ter a disposição de mudar; se queremos fazer do Brasil uma grande nação, devemos mirar o futuro. O passado só tem valor quando contribui para nos empurrar para frente, para o desenvolvimento, para o crescimento econômico que gera bem-estar, riqueza e empregos. Não é hora de revisitar chagas antigas, cicatrizadas.

Parece que não vimos Invictus, não conhecemos Mandela e, menos ainda, os horrores do apartheid. Nos últimos dias, em uma ostensiva manifestação de autismo político, a Câmara dos Deputados adiou, mais uma vez, a aprovação do Projeto Ficha Limpa, de iniciativa popular e sustentado em 1,5 milhão de assinaturas de cidadãos brasileiros, recolhidas em todas as regiões do País e que tem, entre muitos outros, o apoio das ADCE’s de todo o Brasil. A postura dos deputados federais é inaceitável, na medida em que tudo que o Projeto Ficha Limpe propõe, traduzindo a vontade do povo brasileiro, é eliminar da vida pública políticos de má índole, já condenados por órgãos colegiados da justiça, autores de crimes hediondos como são todos aqueles praticados contra o povo.

Ao postergar sua votação, em evidente ação fisiológica e corporativa, nossos atuais parlamentares, assim como os políticos que se pretende banir, tornam-se também deputados ficha suja. É bom que nos lembremos deles em outubro, para, diante das urnas, esquecê-los definitivamente. Outros exemplos vicejam, criando dois Brasis – o do povo, que deseja um país correto, sério e ético; e o dos nossos líderes, que não se avexam diante das manchetes que anunciam escândalos sucessivos, fruto da mais absoluta falta de compromisso com a sociedade e com a nação.

Nesta toada, também o poder executivo sinaliza seu descompasso com os tempos modernos ao propor o Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), de forte cunho ideológico e sem a devida audiência da população. De uma canetada só – como muito oportunamente o ESTADO DE MINAS vem mostrando em editoriais e na série de reportagem iniciada neste domingo – decide sobre temas importantes e polêmicos, que a sociedade brasileira repudia e sobre os quais ainda não há consenso. Entre eles, destacam-se a descriminalização do aborto, a união civil entre pessoas do mesmo sexo, o direito de adoções por casais homossexuais, a proibição de símbolos religiosos em prédios públicos. E uma proposta absurda: a mediação de conflitos de invasões de propriedade, notadamente terras rurais, em audiências públicas, com força até para mudar decisões do Judiciário.

No PNDH, duas outras questões são de arrepiar, provocam calafrios: a instituição de controle sobre a imprensa/mídia, ressuscitando o fantasma da odiosa censura, o que é inadmissível em regimes verdadeiramente democráticos; e a instituição da Comissão da Verdade, focada em revolver os episódios do período da ditadura militar de 1964 a 85. São ambas, chagas superadas pela sociedade brasileira. É admissível o desejo de justiça e a busca de compensação em favor dos que sofreram durante o regime de exceção, mas é preciso cautela. Principalmente, é preciso equilíbrio para reconhecer que foi uma época de graves conflitos, que existem prejudicados dos dois lados. É importante lembrar que a anistia já aconteceu e que foi a partir dela que o Brasil retomou o curso normal de sua história, rumo a novos tempos, ao futuro.

Este deve ser o foco. A sociedade brasileira exige uma agenda positiva, governantes corajosos e probos, que encarem e encaminhem os problemas, que façam as reformas das quais a nação tanto precisa, que promovam avanços na administração pública, na eficiência da máquina do estado, nas questões eleitorais, como o financiamento de campanha, que racionalizem e reduzam os tributos. Temos problemas de qualidade de ensino, de saúde, de habitação, saneamento, de segurança e infra estrutura. Os desafios são muito grandes, não podemos despender tempo com temas do passado já vencidos e ultrapassados. Não será mudando o nome do time de rúgbi e as cores de seus uniformes que vamos enfrentá-los e vencê-los. Que Madiba nos ilumine!  


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